É num palco que o vencedor do prémio BBC Sound of 2016 se sente em casa
Apesar de ter lançado recentemente o álbum Phase, Jack Garratt tem vindo a percorrer um caminho específico que o levou ao estatuto de nova coqueluche da música britânica. Um caso típico de sucesso garantido, trabalhado com afinco e projeção de futuro.
Debaixo das luzes desde 2014 – ano em que lançou os singles “Remnants”, “The Love You’re Given” e “Worry” – a carreira do jovem britânico tem sido construída através da sua capacidade multi-instrumental de dar alma às músicas que compõe bem como pelo trabalho de marketing feito pela editora Island. Não é por acaso que 11 dos últimos 14 prémios BBC Sound Of… foram ganhos por artistas associados à editora, que faz parte da Universal.
Assim sendo, era de esperar que Phase fosse a “grande festa” de Garratt, transformando o hype em algo mais palpável, condensado. O problema é que a espera causou demasiada expetativa e no fim o álbum fica um pouco aquém do se esperava.
Não estou a dizer que este é um mau começo para Garratt. É um bom trabalho que contém muito do que será a música pop nos próximos anos: um cruzamento de vários estilos como eletrónica, gospel e acústica. Quando se ouve o álbum é impossível não encontrar semelhanças com James Blake, Jai Paul, Disclosure ou Sam Smith. Nada disso faz confusão, seja dita a verdade.
Os artistas de hoje em dia “bebem” muito da sua inspiração dos colegas. O que os diferencia é a capacidade que têm – ou não – de deixar uma semente emocional nos ouvintes de modo a que as músicas se transformem em emoções ou sentimentos porque esses nunca são esquecidos.
Nesse aspeto, Jack Garratt é exímio. As músicas são capazes de criar uma ligação com o ouvinte através das letras profundas, apoiadas no apreciável falseto do músico e das batidas eletrónicas, R&B, blues e pop que fazem com que a mistura se torne viciante, estranha e acima de tudo, bastante sexy.
O som eclético de Jack Garratt está espelhado em “Breath Life” e “Surprise Yourself”, duas das melhores faixas do álbum, e no contrastante “I Know All What I Do”, que mais parece um hino irlandês que serve na perfeição para um momento dramático de qualquer filme de amor não correspondido. A consistência da música não estruturada ao longo do projeto é um dos aspetos mais apelativos do álbum. As músicas podiam soar repetitivas ou aborrecidas, mas não. Cada faixa tem uma vida própria que sabe deixar o ouvinte cativado de princípio ao fim.
Dito tudo isto, porque é que Phase acaba por parecer algo genérico?
Voltemos ao marketing. Desde que apareceu, Jack Garratt tem sido favorecido como um dos artistas mais interessantes para ver ao vivo. As várias atuações em festivais de relevo como Reading e Glastonbury deram uma força essencial às suas músicas, de modo a que se tornassem rapidamente conhecidas. Depois vieram as atuações em rádios como a BBC e outras, sempre com o apoio incondicional das redes sociais. O plano parecia bem encaminhado. Foi ao vivo que nos apercebemos que as músicas ganham uma vida própria. Foi aí que nos vimos o talento de Jack Garratt para tocar vários instrumentos ao mesmo tempo com grande facilidade e bastante dedicação.
Basta ver alguns dos muitos vídeos que estão disponíveis no YouTube:
Comparando as atuações ao vivo com o que se ouve em Phase, a sensação geral é que algo se perdeu na passagem e a verdade é que a sonoridade deixa de ser tão excitante quando compilada num trabalho gravado em estúdio. Falta emoção, surpresa, irreverência. Faltam várias coisas para suportar o hype que foi criado ao longo dos últimos dois anos.
No fim, Phase é um bom trabalho que não deixa grandes marcas, mas Jack Garratt é um artista que não se deve perder a oportunidade de ver ao vivo.